sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Mais uma transcrição de áudio para elucidar a crise política gaúcha







A história da transcrição de uma gravação de áudio, supostamente, enviada de dentro das galerias do Presídio Central, pode nos ajudar a valorar a atual crise social gaúcha. Num contexto em que o assunto são crimes contra a vida, todos discutem as conseqüências políticas.

O caso é que, para o bem ou para o mal, a população sofre as conseqüências reais da criminalidade. E a elite, política, econômica e cultural debate a questão em termos da linguagem jurídica formal.

Dando a palavra a um criminoso, (certamente, pela vivência um especialista neste assunto) poderemos por em perspectiva os fatos surreais que a política tem exibido ao povo gaúcho: Afinal o que fazemos com os suspeitos em um regime democrático em pleno vigor do estado de direito?

Um presidiário fala:

Eu sou um jovem de classe média baixa. E... Participei a algum tempo de um assalto. Ajudei uns amigos meus que me vendiam drogas a, a estourar um cofre, um caixa eletrônico de um hospital de Porto Alegre que, tava com (...) tava abastecido porque era final de mês e os trabalhadores iam buscar seus salários. Tenho vivido aqui no presídio central (suspiro) já há seis meses em prisão liminar. Oficialmente eu sou suspeito. Mas eu não nego o meu crime e por causa das drogas eu optei por esse caminho.

Logo vou sair. A minha liminar tá pra sair. E eu (...) já tenho inclusive alguns trabalhos pra realizar quando saí daqui. Hã, se eu não realizar eles eu, eu posso morrer. Mas são assaltos também. Só que dessa vez eu vô assalta com armas, e com uma estrutura melhor. Talvez eu não seja preso.

Mas eu faço muitas coisas aqui no presídio, aqui no pavilhão. Eu já tenho um cara que me ajuda aqui, que me protege. Que é um chefe da facção a qual eu me filiei pra não morrer. Ele, ele... Ele me abusa, ele me usa. Sexualmente. Mas ele garantiu que daqui prá fora. Da porta do presídio pra fora eu sou um homem. Que o meu sucesso nessa carrera vai dependê do meu sucesso nas missões que eu vô ter que cumprir. E não do que aconteceu aqui entre eu e ele... O que acontece entre os presos. (suspiro) Essa rotina de se estuprado.

Mas eu, (pausa) eu escuto muito rádio também. Escuto muito a rádio gaúcha. Ouço tudo o que tá acontecendo. A crise toda da corrupção no DETRAN. E tenho feito um paralelo entre a minha condição e a da governadora do Estado. Como eu tô em prisão liminar, embora eu tenha admitido meu crime, do ponto de vista formal, eu e ela somos suspeitos. E há a remota possibilidade de ela ser inocente, assim como há a remota possibilidade de tudo isso que eu to passando ser apenas um sonho.

Mas enfim, somos os dois suspeitos. Eu aqui, nesse presídio imundo (suspira) essas paredes sujas. Bem diferente do lugar onde eu cresci, da família com quem eu cresci. Mas enfim foi a minha escolha. Essa governadora parece que fez as escolhas dela também. E... tá levando a vida de acordo com a escolha que ela fez.

Mas eu acho que... Não vô fala o crime, por que se não fica muito pesado, mas eu acho que infringir a lei pra mim não compensa. Mas parece que para ela... Pra mim, não compensa ser suspeito de ter infringido a lei. Meus comparsas me entregaram. A polícia me busco e eu to aqui.

Os comparsas da governadora entregaram ela. Ela é suspeita e ela tá no (...) palácio do governo. Então... Parece que é diferente a situação dela e a minha. Eu lembro do escárnio do delegado, do juiz, ao me, ao determinarem a minha prisão. A Raiva que eles sentiam de alguém, parecido com os filhos deles, ter se envolvido com drogas e com assalto a cofre, a caixa eletrônico. Nem arma agente usou.

Mas a governadora também não usou nenhuma arma. Mas eu acho que eu sei por que, que eu to aqui e ela tá no palácio do governo: Eu to aqui por (...) que o meu crime foi contra vítimas que tem rosto, nome e endereço. São trabalhadores de um hospital que iam receber o salário do caixa eletrônico que agente robô. E que o dinheiro, certamente não voltou para eles porque o banco tem seguro... Enfim, não sei onde foi parar o dinheiro que agente robô.

Eu sei que aqui no presídio agente tem muitas possibilidades de aprender a ganhar dinheiro na carreira de infringir a lei, Né? E muitos riscos.

Mas eu acho que o problema é que a governadora, que é suspeita de ter participado de um esquema de fraude no DETRAN. É isso que vocês dizem. Fraude. Porque ela roubou e lesou os cofres públicos.

Então, eu to entendendo porque mesmo sendo suspeita desse crime ela continua no palácio. Ela continua lá porque (...). Porque o cofre público não tem cara, não tem filho, não é alguém que tenha sido roubado.

Conheço alguns presos aqui que roubaram relógio, que roubaram não sei o que, coisas pequenas, pequenos furtos. Tão presos. Mas as coisas que eles roubaram tinham dono. Cofre público parece que não tem dono.

Eu acho que a população devia pensar na governadora como alguém suspeita de roubar. Acho que o crime dela e o meu tem muito a vê. A suspeita do crime que ela... Pelo qual ela responde. A suspeita do crime pelo qual eu respondo, eles tem conseqüências e as vítimas não são os cofres públicos.

Eu tenho as mãos sujas de sangue por usar drogas, por ter tentado, conseguido, roubar um cofre eletrônico. E a governadora tem as mãos sujas de sangue. Do sangue dos motoristas, dos pedestres, dos passageiros que morrem todo ano em acidentes de transito. Pelo menos desde o início dessa fraude, dessa crise, desse crime.

E eu vô te dizê. Eu entendo porque o vice-governador odeia tanto ela. Parece que ele perdeu uma filha, né? Uma filha que tinha... Num acidente de transito, parece que ela tava dirigindo, parece que em alta velocidade, e ela morreu. Eu entendo porque que o vice governador odeia ela. Porque ela se sujou, ela se envolveu num crime cujo sangue da filha dele tá envolvido. É por isso. É por isso que ele tem ódio dela.

E se as... Se os juízes vissem nisso, vissem nela, o sangue dos motoristas que se acidentam no transito. Vissem nesse dinheiro que foi roubado do DETRAN. Que não é do DETRAN é de cada pessoa que ia lá renovar ou tirar a carteira d motorista. Eu nunca tirei e sempre dirigi. Mas quem paga para tirar: Esses foram roubados. E as conseqüências das fraudes no DETRAN são essas que vocês falam todo dia aí na rádio. Que é pra respeitá os sinais de transito. Que é pra dirigi com prudência.

Talvez se a sociedade visse a governadora como suspeita de um crime de sangue ela já não tivesse mais no palácio.

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