quarta-feira, 23 de março de 2011

MAS AFINAL ? FALTA OU SOBRA RECURSO NA SAUDE

Quem responde é Gilson Carvalho, Médico Pediatra e de Saúde Publica

As duas posições extremadas continuam sendo assumidas no Brasil. Uns dizendo que falta dinheiro e outros, radicalizando de outro lado, falando, alto e bom som, que o problema único ou maior, é a falta de gestão (entenda-se incompetência gerencial das pessoas e processos públicos de trabalho obsoletos). Neste texto quero apenas demonstrar a falta de recursos, mas reafirmando que existe realmente má gestão que deve ser corrigida concomitantemente. Sou adepto e defendo a multicausalidade: falta de dinheiro, falta de condições de vida do brasileiro, falta do novo modelo SUS, falta de gestão, falta de honestidade.

Importante lembrar do ditado latino que diz que ?toda comparação claudica (manca)?. Os estatísticos sempre dizem que os dados obtidos, apenas dão pista por se aplicarem exclusivamente aquela situação observada não se podendo generalizar nem inferir para outras situações. Os estudos com os quais vamos nos exercitar têm várias limitações de toda comparação, mas, são os estudos possíveis e que podem nos indicar da insuficiência de recursos destinados à saúde no Brasil.

Valores gastos em Saúde no Brasil em 2009 – Federal 58 BI, Estadual 34 BI, Municipal 35 BI, TOTAL PUBLICO 127 BI, Privado Planos e Seguros 64 BI, Gasto Direto 24 BI, Medicamentos 55 BI, TOTAL PRIVADO 143 BI;

Se tomarmos o gasto com saúde pública pelo número de habitantes por dia de um ano, teremos o Índice EJ&RG. Eduardo Jorge(EJ) e Roberto Gouveia (RG) são dois médicos sanitaristas paulistas, ex-deputados federais, próceres da Reforma Sanitária e que criaram este indicador para, mais facilmente, demonstrar quão pouco se gasta com saúde pública no Brasil. Para 2009 a estimativa o Índice EJ&RG é de R$1,82 reais por dia. Muito pouco! Este valor é menos que um simples vale transporte.

Podemos fazer outro tipo de simulação demonstrando que há chance de se fazer a virada público-privado, onde o gasto público pode ser demonstrado como um pouco maior que o privado. A base deste raciocínio é levar em consideração a renúncia fiscal do Governo Federal no ano de 2009.

O gasto privado com saúde, como acima mostrado, foi estimado em R$143 bi. Se subtrairmos deste valor a real renúncia fiscal do imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas (6,5 bi) concedida ao privado, vamos chegar a R$136,5 bi.
De outro lado, o atual gasto público estimado é de R$127 bi se a ele acescentar estes mesmos R$5,5 bi teremos R$132,5 bi. A renúncia fiscal aqui é tomada, devidamente, como um gasto público com saúde.

Se somarmos a estes recursos a renúncia fiscal de Medicamentos (5,1 bi) e concedida às Filantrópicas da Saúde (2,1 bi) teremos R$139,7 bi.

O resultado final desta subtraçao de recursos indevidos de renúncia fiscal no privado e soma no público, teremos: PRIVADO 136,5 BI e PUBLICO 139,7 BI

Tem outro raciocínio que poderia demonstrar, mais enfaticamente, o gasto público como maior que o privado. Não conseguimos fazê-lo pois não existe pesquisa que informe quanto de dinheiro público é gasto para o pagamento de planos privados para os servidores públicos. A título de lembrança podemos dizer que o melhor plano de saúde do Brasil , o dos parlamentares, é financiado totalmente com dinheiro público e consta como gasto privado! Poderíamos ir mais extensamente neste raciocínio e identificar outras áreas públicas que gastam dinheiro público em planos privados: judiciário, ministério público, tribunal de contas da união, servidores dos ministérios (GEAP), funcionários das estatais e fundações... etc. Além disto temos a mesma coisa com os recursos dos Estados e dos municípios, gastos com planos de saúde privados, para a sua burocracia.

1. QUANTO GASTAM OS PLANOS DE SAÚDE PARA GARANTIR MENOS AÇÕES E SERVIÇOS QUE O SUS?

Qual o valor gasto pelos Planos e Seguros de Saúde em 2009 no Brasil? Qual o número de beneficiários destes planos e seguros? Qual o valor per capita? Qual o volume de recursos, se usado este valor per capita, para a população brasileira de 2009?

Os Planos e Seguros de Saúde declararam ter arrecadado R$64 bi para atender cerca de 43 nilhões de usuários o que resultaria num valor per capita de R$ 1488.

Se usássemos o mesmo per capita que os planos, para atendimento de toda a população brasileira, teríamos: R$1488 que multiplicado pelos 191 milhões de habitantes apontaria para uma necessidade de aporte total ao SUS de R$ 284 bi.

Vale lembrar que o valor arrecadado pelos planos e seguros não é para garantir o tudo. Aí não se incluem ações denominadas de saúde pública que incluem atos individuais e coletivos, preventivos e curativos, de baixa e alta complexidade. As ditas ações de vigilância à saúde (sanitária, epidemiológica, ambiental, saúde do trabalhador etc).

1. QUAL O PERCENTUAL DO PIB UTILIZADO POR OUTROS PAÍSES?

Tomando destes dados acima, podemos estimar que se aplicasse no mínimo a média do gasto público com saúde do mundo, em relação ao PIB teríamos 5,5% do PIB o que representaria no Brasil R$ 172 bi, muito mais que os R$127 bi de 2009. Representaria 34,5% a mais que o gasto público em 2009.

Se, otimistamente, pensássemos no uso do percentual do PIB gasto pelos países desenvolvidos de alta renda(média de 6,7%) muito próximo do da Europa 6,6% ou das Américas 6,4% O SUS precisaria de R$209 bi o que representa 64,5% a mais que seus atuais R$127 bi de 2009.

Numa visão ultra otimista, se trabalhássemos com a hipótese de 10% do PIB teríamos necessidade de R$318 bi ou seja 150% a mais que os R$127 bi de hoje.
1. QUAL O VALOR MÉDIO DE RECURSOS PER CAPITA UTILIZADOS POR OUTROS PAÍSES?

Um dos bons indicadores é medir os recursos calculados per capita em relação à população do mundo ou de determinada região ou país. Seguindo este raciocínio podemos simular destinar à saúde, numa melhor hipótese US$2000 por habitante. Para tanto a necessidade deveria ser de US$382 bi ou R$573 bi. Se usarmos a média das Américas de US$ 1437 teríamos necessidade de US$274 bi ou R$412 bi ou da Europa, US$1401, US$268 bi ou R$401.

Se optarmos por usar a média do mundo com a neutralização dos extremos teríamos US$ 493 PC e um gasto total de US$94 bi ou seja R$141 bi ou 11 % a mais que os R$127 bi de 2009.

1. QUAIS AS NECESSIDADES IMEDIATAS DE MAIS RECURSOS?
Resumindo todas as hipóteses de necessidade de mais recursos para a saúde no Brasil, tomando-se vários paradigmas nacionais e internacionais. Partindo dos valores públicos alocados em 2009 no valor de R$127 bi temos uma variação entre R$ 162 bi com levantamentos de necessidades imediatas até um ótimo desejável de R$714 bi tomando-se o que gastam per capita os países de alta renda. As alternativas acima vão entre um % mínimo necessário de mais 28% a 462% e uma média de 231%. As hipóteses são eloquentes demonstrativos da maior necessidade de recursos o que não elimina o dever de ter mais eficiência nos gastos.

Não se pode cair na falácia da planieconomocracia governamental afirmando que gasta-se muito e gasta-se mal.

Convencermo-nos, calibrando o discurso verdadeiro do: gasta-se pouco e gasta-se mal (mau uso e uso errado)

Espero ter conseguido demonstrar que além de medidas eficientizadoras, as mais diversas, há necessidade de mais recursos para a saúde.

Hoje o foco nesta busca de mais recursos tem que ser os de origem federal, já que os Municípios estão colocando, em média 30% a mais que os mínimos constitucionais. Os Estados não têm cumprido os mínimos, mas, se o cumprirem estarão, certamente também no seu limite.

Posso concluir numa visão de futuro fazendo uma pergunta: a integralidade em saúde é possível???!!!...

Dois resultados podem igualmente ser esperados, sem nenhuma certeza deste ou daquele.
Podemos ter uma integralidade menor e pior que hoje... basta permanecermos no modelo atual (Anti Sus ou Pré-Sus). Se continuarmos neste caminho estaremos antecipando a exaustão do sistema e a frustração do sonho de mais vida com saúde-felicidade.

O outro cenário, que devemos buscar, é aquele em que a integralidade será possível e maior e melhor do que hoje. Basta mudarmos o modelo atual de fazer saúde, praticando o SUS constitucional e legal. Se este caminho trilharmos estaremos antecipando a conquista do sonho de mais vida com saúde-felicidade!

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom. Com dados como esses é possível fazer um bom debate.
Parabéns!

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