terça-feira, 29 de março de 2011

O tamanho do desvio de verbas do SUS


Criado em 1990 para assegurar o pleno atendimento médico-hospitalar à população, o Sistema Único de Saúde (SUS) transformou-se no tesouro mais nobre e vulnerável do orçamento público brasileiro. Recursos bilionários e pulverizados são desviados de hospitais, clínicas credenciadas e unidades de saúde. Investigações administrativas do Ministério da Saúde e da Controladoria Geral da União, concluídas entre 2007 e 2010, apontaram desvios de R$ 662,2 milhões no Fundo Nacional de Saúde.

O prejuízo pode ser bem maior, pois somente 2,5% das chamadas transferências fundo a fundo são fiscalizadas, de acordo com a CGU.

Só as irregularidades já atestadas financiariam a construção de 1.439 unidades básicas de saúde e de 24 Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs), além de pagar os salários de um ano inteiro, com 13, de 1.156 equipes do Saúde da Família.

Em procedimentos, equivaleria a 1,21 milhão de cesarianas ou 1,48 milhão de cirurgias de hérnia.

O volume de dinheiro fiscalizado contrasta com a quantidade de desvios impunes. As fraudes incluem compras e pagamentos irregulares, superfaturamentos, desperdício com construção de hospitais que não funcionam e até contratação de um mesmo médico para 17 lugares ao mesmo tempo.

Nos quatro anos analisados, o prejuízo foi de R$ 223,07 milhões.

Para ter uma ideia dessa sangria a conta-gotas, O GLOBO recolheu detalhes de auditorias em vários estados e visitou quatro cidades.

Em Aparecida de Goiânia (GO), na Região Metropolitana, as 17 novas enfermarias do Hospital de Urgência custaram R$ 1,5 milhão, ficaram prontas em dezembro, mas não foram entregues pela construtora.

Os 38 leitos chegaram no mesmo mês, mas permanecem no almoxarifado, entulhados e se deteriorando na chuva. A construtora se esqueceu da saída de emergência, e os leitos não passam pelas portas dos quartos.

Em Goiás, contratos sob suspeita
APARECIDA DE GOIÂNIA (GO) - Quando não há fiscalização, os milionários contratos de serviços de saúde, pagos em parte com verba federal do SUS, ficam numa caixa-preta, aparentemente inacessíveis até ao secretário de Saúde. É o que ocorre em Aparecida, na região metropolitana de Goiânia, onde 77% da população de quase 500 mil habitantes não têm atendimento básico de saúde, revela reportagem de Roberto Maltchik, publicada esta segunda-feira pelo GLOBO. A prefeitura conta só com um prestador de serviço e uma organização social, cujos contratos sequer foram apresentados ao Conselho Municipal de Saúde (CMS). As despesas anuais são orçadas em quase R$ 13 milhões.

Os contratos mais vultosos e que já levantaram suspeitas no Ministério Público foram fechados com o Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Humano (Idtech), criado em 2005 e que teve como patrono na Câmara de Vereadores de Aparecida o então vereador Francisco Júnior (PMDB), do mesmo partido do prefeito de Aparecida, o ex-senador Maguito Vilela (PMDB).

Atendimento só no papel : equipes de saúde da família não cumprem a carga horária

Há mais de um ano, o CMS formalizou pedidos para ter acesso aos documentos e discutir o serviço prestado. Semana passada, o CMS discutiria o tema, mas o Idtech não participou.

- Se continuarem assim, pediremos a suspensão dos pagamentos - diz o presidente do CMS, Fábio dos Reis Fonseca.

O mais intrigante é que o Idtech e o secretário de Saúde, Rafael Nakamura, dizem que não há o que esconder e que o serviço está sendo prestado normalmente. Segundo Nakamura, o problema é que o contrato está na Secretaria de Licitações:

- Nunca vi esse contrato. Já procurei no controle interno esses contratos... Por mim, entrego para você... Mas, aqui em Aparecida, não funciona tudo bacana, tudo redondo - disse.

O GLOBO obteve os contratos de gestão no site do Idtech. No documento, a empresa deve prestar três serviços essenciais: marcar consultas, fazer atendimento ambulatorial e regular os leitos hospitalares. Quem fiscaliza o Idtech é a própria entidade. Nakamura diz que "todos os instrumentos contratuais firmados são submetidos aos órgãos de controle interno e externo na forma da legislação vigente", informação negada pelo Conselho de Saúde.

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